domingo, 6 de setembro de 2009

SAFO: O DESEJO, O SEXO E A POESIA FEMININA

O fogo e sensualidade que existe no corpo da mulher. O desejo. O prazer de ser ela mesma. Amar. Querer. Tudo isso era Safo. Natural de Eresso, localidade próxima à Mitilene, capital da ilha de Lesbos, na antiga Grécia, nasceu no ano de 612 aC. Maior poetisa lírica da Antiguidade e por que não dizer a primeira mulher poeta do mundo conhecido. Em Mitilene estudou dança, retórica e poética, o que naquela época só era permitido às mulheres aristocratas.

Na época do ditador Pítaco, que governava a ilha de Lesbos, Safo foi acusada de conspiração e terminou sendo exilada na cidade de Pirra, mas na realidade, a poeta nunca ligou muito para a política. Safo nada tinha de conservadora. Safo nada tinha de recatada. Safo nada tinha de pudor. Era uma mulher atrevida e uma amante exagerada da vida e das mulheres mais jovens.

Após seu retorno do exílio, em Pirra, devido ao seu comportamento, foi exilada de novo na Sicília, onde conheceu um homem rico e com ele casou-se, tendo uma filha. Ficou viúva e retornou para Lesbos, onde fundou um colégio para moças da alta sociedade de Mitilene. Nesse colégio ensinava música, poesia e dança e se comprazia em prazeres mundanos com suas alunas, as quais chamava de hetairas, que em grego significa companheiras.

Safo era uma grande mestra da arte da dança e da poesia, mas pelo que se soube possuía outras artes. Estas mais humanas. Seus relacionamentos com as alunas chegaram ao conhecimento dos pais que rapidamente retiraram de sua escola as filhas. Sua favorita era Átis, por quem tinha uma paixão irrefreável. Para Átis ela compôs o poema “Adeus a Átis”, considerado até hoje como um dos mais perfeitos versos líricos de todos os tempos. “Doce e amargo tormento” era uma das frases inserida no poema, que criou um estilo de forma singelo e sóbrio. Muitos poetas utilizaram depois esse estilo de Safo.

Ovídio recolheu a lenda que Safo, na idade madura voltou a amar os homens, ao apaixonar-se por um marinheiro chamado Faon, o qual não lhe correspondeu, daía ela matou-se, atirando-se de um precipício. Em outra lenda, diz-se que ela, resignada com o destino que a levava a amar e a desejar as mulheres recusou outro pedido de casamento escrevendo o seguinte: "Se meu peito ainda pudesse dar leite e meu ventre frutificasse, iria sem temor para um novo tálamo. Mas o tempo já gravou demasiadas rugas sobre minha pele e o amor já não me alcança mais com o açoite de suas deliciosas penas."

Sem medo de errar, a hipocrisia humana e a moralidade retardada condenaram Safo por 26 séculos. Foi no século 11 em que ela teve sua maior condenação pela hipócrita Igreja Católica que resolveu queimar toda sua obra poética contida em nove volumes. Ainda bem que alguma coisa conseguiu ser salva. Nos fins do século 19 dois arqueólogos ingleses descobriram, por acaso, em Oxorinco, sarcófagos envoltos em tiras de pergaminho, numa das quais eram legíveis uns seiscentos versos de Safo.

Restou apenas isso da primeira e maior poeta da história ocidental. O filósofo Platão já tinha ensinado: "Dizem que há nove musas, que falta de memória! Esqueceram a décima, Safo de Lesbos." E outro que também tornou-se seu admirador na antiga Grécia foi Sólon, que depois de escutar de seu neto a recitação de um poema de Safo, exclamou: "Agora poderei morrer em paz!"

Safo continua viva nas mulheres que amam a vida e que põem seu desejo à vista de todos e que não têm medo nem vexame de dizer Eu Te Amo, tanto a mulheres como aos homens. A divina hetaira é aqui homenageada por mim.

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A UMA MULHER AMADA

Ditosa que ao teu lado só por ti suspiro!
Quem goza o prazer de te escutar,
quem vê, às vezes, teu doce sorriso.
Nem os deuses felizes o podem igualar.
Sinto um fogo sutil correr de veia em veia
por minha carne, ó suave bem querida,
e no transporte doce que a minha alma enleia
eu sinto asperamente a voz emudecida.
Uma nuvem confusa me enevoa o olhar.
Não ouço mais. Eu caio num langor supremo;
E pálida e perdida e febril e sem ar,
um frêmito me abala... eu quase morro... eu tremo.

(fragmentos de um poema) - Tradução de Joaquim Fontes
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PARA ANACTÓRIA

A mais bela coisa deste mundo
para alguns são soldados a marchar,
para outros uma frota; para mim
é a minha bem-querida.
Fácil é dá-lo a compreender a todos:
Helena, a sem igual em formosura,
achou que o destruidor da honra de Tróia
era o melhor dos homens,
e assim não se deteve a cogitar
em sua filha nem nos pais queridos:
o Amor a seduziu e longe a fez
ceder o coração.
Dobrar mulher não custa, se ela pensa
por alto no que é próximo e querido.
Oh não me esqueças, Anactória, nem
aquela que partiu:
prefiro o doce ruído de seus passos
e o brilho de seu rosto a ver os carros
e os soldados da Lídia combatendo
cobertos de armadura.
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O AMOR

O amor, esse ser invencível, doce e sublime
que desata os membros, de novo me socorre.
Ele agita meu espírito como a avalanche
sacode monte abaixo as encostas. Lutar
contra o amor é impossível, pois como uma
criança faz ao ver sua mãe, vôo para ele.
Minha alma está dividida: algo a detém aqui,
mas algo diz a ela para no amor viver...
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Um dos fragmentos encontrados mostra profundo amor maternal por sua filha Kleis, que se reflete na seguinte estrofe:

Tenho uma formosa filha
que tem para mim
a esplendorosa beleza de uma flor de ouro,
minha amada Kleis,
a quem não trocaria por todas as riquezas da Lídia,
nem tampouco pela formosa Lesbos.
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O homem belo só o é quando o contemplam, mas o homem sábio é belo mesmo quando ninguém o vê”. Safo de Lesbos
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ODE A VÊNUS

Filha de Jove, que tens altarers
Em cem lugares, Diva Falaz:
Ah! poupa mágoas a quem te adora
A quem implora favor e paz.
.
Tu já outr'ora piedosa ouviste
O brado triste da minha voz:
E da paterna mansão celeste
A mim vieste pronta e veloz.
.
Ao nívio carro jungido tinhas
Das avezinhas o meigo par.
Ele voando pelo ar sereno
Em prado ameno veio pousar.
.
E tu, sorrindo, de mim diante
Meigo o semblante falaste assim:
"Safo, eu te vejo tão consternada,
Por que magoada chamas por mim?"
.
"Paixão te oprime? Gemes, suspiras
Dize, a que aspiram com tanto ardor?
Alguém, ingrato, se te não rende?
Ah! quem te ofende com tal rigor?"
.
"Há de rogar-te, se te ora engeita
Teus dons rejeita? Dons te dará:
Desquer-te amado? Por ti já esquiva
Em chama ativa se abrasará".
.
Também agora, deusa benigna
A mim se digna dar proteção:
Auxiliadora neste conflito
Vale ao aflito meu coração.
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PUDOR

A teus dotes qual mais encantador
Tu ajuntas, amável criatura,
Um para mim de todos o maior,
E que até embeleza a formosura:
O pudor!
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"O sangue flutua rápido em minhas veias; um acre calor invade minhas fibras. Ruborizo-me. Baixa a voz ao responder um gentil pensamento, inutilmente procuro e não acho. Com tumulto e força bate o sangue no meu peito. Morre a voz, enquanto eu passo minha língua em sua boca".
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"Guardo a chama dentro do meu sangue e fervo,
um estúpido e continuado tintinar, me enche
os ouvidos, e sonho. Levanto o olhar, e entrevejo
sombra de macho. Me encontro apagada, um suor
gelado, a fisionomia morta como erva que não
cresce, tremendo em arrepios, enquanto minha
língua ativa se dirige em tua direção. Anseio
a ti cada vez mais, quase até a morte certa,
apagar este fogo."
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"Virgindade, virgindade me deixas, onde vais?
Não voltarei mais para ti, nunca mais.
Tu é a flor purpúrea, que meus braços rudes,
pisam no abraço e aqui deitam, enquanto la fora
a brilhante aurora de beijos, carícias e humores
e morte, venham para mim, porque tanto te desejei..."
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"Uiva o vento entre as árvores. O meu não parece um rumor,
mas é o amor que corre, a paixão devoradora pelos teus lindos
cabelos e teus membros alvos, me esgota e me quebra.
Assim só, te desejo, eu morro!"
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"Alegria de viver, mais não tenho. A vontade de
morrer se apossa de mim, ver o lótus, molhado de
orvalho às margens do Aqueronte..."
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"Oh, fêmea, que meu hábito não sentir e não provar, ir
aqui e ali entre obscuros mortos que esvoaçam sobre sua traição.
Oh amor, pudesse eu com meus braços sufocar-te. e aquela
vida de erros em segundo apagar..."
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"É como a maçã vermelha em seu ramo mais alto, os
colhedores a esquecem. Não a esqueceu quem era como
ela, mas também não conseguiu alcançá-la".
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Consultei:
www.brasilescola.com/biografia/safo-lesbos
Poemas E Fragmentos Safo De Lesbos, Fontes, Joaquim Brasil – Iluminuras

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